O Parkour é ferramenta de empoderamento... desde que você não seja um ícone de destruição
By Carolinne Goes - 23:43
Texto: Poliana Sousa - @poliizz.
Proprietária e Diretora da Drop and Leap Escola de Parkour - Brasília. @dropandleap
A
necessidade de se praticar exercícios não é de gênero. Todos deveríamos
praticar alguma modalidade e se apaixonar em movimentar o corpo dentro das suas
possibilidades. Porém, a grande maioria da população ainda não se encontrou ou
ainda não escolheu ou se encaixou em um esporte. Enfim, tenhamos calma,
isso ainda é reversível.
Aqui vamos falar das mulheres que já se
encontraram. Daquelas que amam se movimentar, aprender habilidades, se superar,
ficar mais fortes, resistentes e corajosas. Estamos falando daquelas que cuidam
de si e estão sempre em busca da satisfação própria. Muitos acham que esse é um
processo simples, só chegar, treinar, evoluir e pronto...tá tudo ali na mão.
Não é tão simples assim. Todas as pessoas sofrem para achar motivação e
inspiração interna para as rotinas diárias. Isso é associado com as
obrigações de trabalho, faculdade, escola, família, dinheiro e, inclusive, os
exercícios. Apesar de estarem todos lutando para isso, as mulheres
precisam carregar mais uma coisinha ainda: a cultura que, automatizadamente,
nos condena até hoje, o machismo.
Já
estamos inseridas em quase todas as modalidades esportistas. Poucas ainda são
as predominantemente femininas. Assim, permeando as difíceis habilidades e
processos lentos dos movimentos complexos, precisamos aprender,
infelizmente, mais uma habilidade: a de lidar e de se impor aos comentários
impetuosos, atitudes retrógradas e que muitas vezes doem.
Sobre a minha especialidade, o Parkour,
tenho muito a dizer. Você conhece? É aquela modalidade ao qual as pessoas se
movimentam pelas ruas. Sobem, descem, saltam, rolam, se penduram, correm
criando percursos e desafios de movimentação. Para nós, mulheres praticantes,
se tivéssemos somente as dificuldades físicas de alturas, distâncias, texturas,
e agarres para nos preocupar seria lindo mas não. Conheça um pouco mais das
dificuldades aos quais passamos:
SOBRE
AS NOSSAS ROUPAS.
Nessa
modalidade, criou-se um estilo europeu friorento de agasalhos e moletons. Aqui,
nós continuamos a usar, inclusive é preferência de muitas ainda, afinal permite
muito movimento e protege de ralados e arranhões. Porém, quando abandonamos
esse estilo e procuramos não sentir calor ou ficar mais à vontade usando
shorts, leggins, tops ou shorts-saia ainda somos repudiadas. Infelizmente, isso
não acontece somente no meio do parkour. Quando isso vai parar ? reflita se você já pensou mal ou comentou
desnecessariamente sobre as roupas das praticantes ?
Entenda e assuma que roupas não definem personalidades
e nem nível de treino, muito menos permitem avaliações e análises de quem ainda
não evoluiu nessa nova geração de liberdade corporal.
SOBRE OS NOSSOS CORPOS OU HABILIDADES
É
triste ver e sentir quando somos comparadas com outros (as). Sofremos bastante
quando acontece. Na filosofia do ensino do parkour aprendemos a aceitar
diferenças e todos os bons praticantes levam isso para a vida...seja dentro da
comunidade ou fora. Acredito que em quase todo o esporte é assim (ou deveria
ser) no qual cada processo de evolução é aceito e respeitado. Sabemos que as
diferenças corporais não acontecem somente pelo gênero mas pela história de
vida, experiências motoras, oportunidades de estímulos, escolhas, entre outros.
É normal e tá tudo bem. Mas parece que o homem fraco ou medroso jamais vai
sofrer como uma mulher na igual situação. Ainda há muitos homens que se
negam a estar na presença feminina e quando estão desprezam ou são mal educados
e displicentes com comentários. Não podemos ignorar.
Claro
que há homens bem evoluídos mentalmente, educados, gentis e estupidamente
respeitosos. Inclusive agradecemos de coração por vocês existirem e também pelo
apoio e força que nos dão a cada treino, obstáculo ou bloqueio.
Aprenda
que sempre vão existir pessoas iniciantes, intermediárias e avançadas em toda
as modalidades. E pode ser mulher, homem, novo, velho, machucados e várias
outras dezenas de situações aos quais precisam ser respeitadas.
SOBRE
ESTARMOS SÓ OU NÃO
Vez
ou outra percebemos o tratamento diferenciado de mulheres que estão “solteiras”
ou desacompanhadas de uma figura masculina. É difícil entender de onde surge o
pensamento que uma mulher, aparentemente sozinha, sempre é vulnerável ou
frágil ou ainda errada em seus comportamentos.
Nós
treinamos sozinhas, podemos viajar para encontros e eventos de parkour sozinhas
à vontade. Quando começamos a treinar, a nossa relação com a rua se transforma.
Aprendemos a ocupar nosso espaço, bem como ser cada vez mais autônoma. Não
estou afirmando que não precisamos de ajuda ou de companhia, pelo contrário, é
sempre bom treinar com quem pode contribuir. O caso é para alertar que,
independente da situação ao qual a mulher se encontra, é necessário o máximo de
respeito.
O
parkour até pode ter começado pela iniciativa dos homens mas acredite, já somos
muitas no Brasil e no mundo. A coisa mudou.
Queremos
que seja cada vez mais raro ou até inexistentes os relatos de praticantes que
são vítimas dessas situações.
Dessa
forma, a partir de um compilado de incidentes, resumimos as frases mais idiotas
e sugerimos algumas substituições. Inclusive, a partir desse texto, estamos
torcendo para as suas atitudes com as mulheres e meninas serem melhores não só
no esporte mais em qualquer ambiente.
AO
PENSAR EM FALAR ISSO
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PREFIRA
USAR ISSO
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Você treina igual
homem
|
Já treina há quanto tempo ?
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Tá mais musculosa
que um homem
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Músculos são o melhor investimento
para a vida
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Sua mão é de macho
|
Sua mão entrega o quanto você é
guerreira e dedicada
|
Tem que ser mais
fácil para você porque você é mulher.
|
Os processos desse movimento são
assim. Quando evoluir mais ele avança para isso.
|
Mulher que faz
assim.
|
Já viu as evoluções desse movimento?
Bora tentar ?
|
Se ela faz, você
que é homem, faz de boa
|
Ela manda bem, pede dica pra ela
|
Essa sua roupa
provoca todos os homens do treino
|
------- Neste caso, melhor você
ficar calado. ------
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Com essa roupa
parece um menino
|
Tá style demais
|
JUNTAS SOMOS MAIS FORTES.
2 comentários
Didático e necessário. Ainda bem que dessa vez vejo mais abertura da galera para ouvir, ler e entender quão nocivo são alguns discursos.
ResponderExcluirAdorei o texto. Sou Prof. Ed. Física escolar e tenho me dedicado a tematizar o Parkour em minhas aulas. Importante discutir alguns temas com meus pequenos no sentido de incutir os bons valores inerentes a essa prática tão rica!
ResponderExcluirObrigado!