Publicado por Ana - Salvador - BA - http://www.murodaana.blogspot.com/
“O  Parkour é uma prática que vem encontrando cada vez mais adeptos pelo  mundo”. Toda vez que escuto essa frase, milhões de coisas me passam pela  cabeça. A primeira delas é: Que legal, isso é importante para o  desenvolvimento do parkour. Logo em seguida me lembro da frequência de  vídeos que vejo com a meninada, que muitas vezes tem técnica, mas, só isso. E me pergunto, até que ponto a prática tem algum sentido  além de liberar adrenalina e endorfina? Nós (praticantes) falamos muito  sobre competições, seus prós e contras e, de um modo geral, não  concordamos com elas por questões “filosóficas”, mas o que venho  percebendo é que nisso existe, no mínimo, uma grande ironia, pra não  falar em hipocrisia. 
Somos  contra competições, mas existe uma luta desenfreada pelo melhor lugar.  Essa garotada que começa com muita força e pouca informação (não por  falta de disponibilidade) tentando desesperadamente fazer o melhor  vídeo, ser o número um. E nessa busca desmedida o que tenho visto é um  somatório de lesões sem precedentes e o pior é que eles carregam isso  como verdadeiros troféus. Executam movimentos, simplesmente. O parkour  tem se tornado pouco a pouco uma prática vazia de sentido.  Todo o contexto filosófico no qual ela está inserida vem se perdendo.  Os “grandes” resultados chegam cada vez mais rápido e dá-se cada vez  menos valor a isso. Eu me pergunto onde está o “être et durer”?  Criamos cada vez mais atalhos, existe um “combo” de movimentos que você  precisa executar para se tornar um bom tracer. Eu realmente não sei se é  purismo meu, mas intuo que tudo que é alcançado fácil demais é também  “desvalorizado” fácil demais. 
É  natural que a molecada comece a praticar porque é “radical”, mas não é  natural que ela fique só nisso. Tenho visto meninos de no máximo 16 anos  que já se lesionaram de forma a sofrer com isso para o resto da vida e  fico me perguntando o porquê disso, se não existem competições. Em  competições, lesões são naturais, você busca ser o melhor, passando por  cima até do seu próprio corpo; mas numa prática não competitiva como o  parkour, é no mínimo imprudência. E se, de alguma forma, “nós” podemos  fazer algo para mudar isso, então, que façamos, pois, do jeito que  estamos essa garotada (que em tese é o futuro do parkour) vai ter que  ser obrigada a parar antes da gente — uma vez que eles estão detonando o  corpo tão rápido que não vão ter como dar seguimento à prática. É fato  que essa ausência de sentido é muito maior, e tange diversas coisas além  do parkour, mas como ele é o assunto do post, não vou fugir. 
Além  da preguiça mental que os jovens têm de pesquisar e sair do raso, do  superficial, existe uma preguiça física, preguiça de preparar o corpo  para “receber” o parkour. E não tenho dúvidas de que esse é um dos  fatores que têm gerado tantas lesões. Se “o cara faz precisões de 15 pés  a dois metros de altura” e não prepara o corpo pra isso, em algum  momento ele vai se machucar. É natural que seja assim. 
Obviamente  que o problema não é só dos novos praticantes, ele vem de algum lugar  e, de alguma forma, ele foi gerado, e não dá para se eximir de  responsabilidade. O que vejo é uma adaptação da filosofia a interesses  pessoais e não o contrário. É muito fácil vermos “veteranos” de saco  cheio de “ensinar” o abecedário do parkour para os iniciantes. E o  raciocínio deles é até coerente: “Na minha época era tão difícil achar  informação e a gente corria atrás, hoje é tão fácil e a garotada é  preguiçosa. Não quer sequer procurar nada, quer tudo mastigado.” Por um  lado isso é verdade, a garotada realmente tem preguiça de ler, de ver os  vídeos menos “fantásticos”, mas isso é cultural. Se noventa por cento é  assim, alguma coisa tem de errado.  E talvez a culpa não seja só deles.  “Somos responsáveis por aquilo que cativamos” e isso é tanto para o bom  quanto para o ruim. Por mais que você não queira, em algum nível você  se torna referência, então, cuidado com a imagem que você passa da  prática porque os “desinformados” vão tomá-la como verdade, independente  de ter sido uma brincadeira ou não. 

6 comentários
Caramba, muito bom artigo!
ResponderExcluirJá está com algum tempo que estava analisando esse fato aqui em minha cidade, tem muita gente que desenvolveu o parkour físico muito rápido e que estão tentando ir cada vez mais longe e mais alto sem algum outro objetivo, ou seja, desenvolvem apenas a técnica e de uma forma bem bruta e só isso. Estava pensando e lembrei-me de um artigo que li do Luiz Gustavo
Onde ele fala que o verdadeiro significado do parkour se perdeu, porque o mesmo é difundido de forma incorreta ou incompleta. Talvez esse seja o problema, ou parte dele.
Artigo do Luiz - http://blog.parkour.com.br/2006/12/passado-presente-futuro/
Já tinha lido isso no blog da Ana. O texto é muito bom e ela toca em pontos interessantes, mostrando uma molecada preguiçosa e a nossa responsabilidade em ser o exemplo para que essa garotada respeite o próprio corpo.
ResponderExcluirConcordo em apenas um ponto, isso é cultural! Mas isso não é culpa só do parkour "desvirtuado". Acredito que é um problema que surge da escola, dos professores ruins e também dos pais (muitas vezes totalmente sedentários). Na verdade não são crianças e adolescentes preguiçosos, são na verdade mal educados (sem conhecimento). Em um Brasil em que cada vez menos se preocupa com a formação de base (corpo físico), a prática de atividades/exercícios físicos, a qualidade da educação física na escola isso vai continuar acontecendo. Porque uns se machucam e outros não? Na verdade é porque uns podem e outros não deveriam fazer algumas coisas em tais épocas. Até o próprio radicalismo e a insanidade vem disso. Pessoas que deveriam ter aprendido alguns conceitos básicos ainda na infância e na adolescencia NÃO APRENDERAM. Podem ter certeza, isso acontece EM QUALQUER EXERCÍCIO ou ESPORTE. Costumo comparar os insanos no parkour com os bombados ridículos da academia ou ainda os tenistas que querem jogar 4 horas por dia ou ainda os boxeadores iniciantes que querem socar 2000 vezes num treino... Enfimm!!!! TUDO É BASE e TEMPO!!!!! Machucar pode acontecer com qualquer um!!! Temos na verdade que aprender a minimizar isso!!!
ResponderExcluirEu também ja tinha lido este artigo no blog da Ana! Acho muito bom e real! Com as meninas é um pouco dificil perceber isto, acho qu epor causa da força fisica que é menor que dos meninos, por consequencia a garota tem que ter muito mais força de vontade e psicológica para entender que vai ter que treinar em dobro pra chegar onde quer. E chega!
ResponderExcluirImagino tbm que isto ocorra de uma forma bem redusida em grupos onde há uma pessoa que treina a mais tempo e preserva a filosofia do Parkour e passa isto aos poucos para o resto do grupo, deixando que cada uma perceba essa filosofia, mas que quando necessário intervém.
Esse artigo é muito bom, ao contrário das meninas ainda não o tinha visto em lugar algum. Ele fala bem de uma das "filosofias" do parkour que como ela mesmo citou está sendo esquecida =/ o ser e durar. O parkour p/ mim vai muito mais além do que um giro, um salto de braço, um mortal, uma estravagância. Ele me ensina coisas que servirão p/ minha vida, o agir com sabedoria, esperando o momento certo do meu corpo. Os movimentos vão surgindo a medida que nosso corpo vai se preparando, as vezes demoram dias, meses, anos. E o que importa, o importante é se preservar e manter sua saúde :) Dei sorte também de ter encontrados traceus que acabaram me ensinando essa filosofia :) Por isso concordo com artigo no ponto que é fundamental a importância dos veteranos com os iniciantes :)
ResponderExcluirLany
haha...quase me mato de rir porque ouvi esta mesma coisa quando comecei a treinar parkour de Leonan Vasconcelos do Parkour Slz:“Na minha época era tão difícil achar informação e a gente corria atrás, hoje é tão fácil e a garotada é preguiçosa. Não quer sequer procurar nada, quer tudo mastigado.”
ResponderExcluirMas foi mais que:"Hoje não é difícil de encontrar informações..." e o resto foi tudo igual ^^'
muito bom o artigo... me identifiquei bastante..
(Karla Pestana - Luanda de Abreu é pseudônimo de blog)